Contos de João Câmara refletem propulsão criativa
Autor radicado pernambucano fala sobre seu novo livro de contos, 'Retábulos, Predela', dividido em três diferentes narrativas
Publicado: 29/09/2025 às 06:00

(Divulgação)
Um dos nomes mais importantes das artes visuais pernambucanas, João Câmara segue em busca de constante renovação. Agora com seu terceiro livro de contos, Retábulos, Predela, o autor reúne três narrativas para observar o dia a dia através de um olhar simultaneamente analítico e literário, que destaca o lado de ficcionista que o artista paraibano radicado em Pernambuco, aos 81 anos, vem cultivando.
As histórias em questão são Anselmo, Emanuel e Carol. A primeira acompanha um trabalhador aposentado cujo maior sonho é viver à beira-mar; a segunda se passa na Angola do século 20 e acompanha registros de guerra narrados em formato de diário; já na terceira, uma prostituta de um cabaré de luxo que dá à luz uma criança que dá título à narrativa.
“Trabalhando há muitos anos como artista plástico figurativo, não sinto incômodo em lidar com figuras que falam e se movem, se inserem, a seu modo, num mundo criado só para elas ou tomado da vida dita real”, comenta o artista em entrevista ao Viver. “Processo criativo é uma instância imprópria para a consciência do artista, um artifício de intelecto que, quando insiste em reger a obra, a assassina prazerosamente. Gosto de escrever sobre temas distantes uns dos outros em geografia e tempos históricos, e isso é também o que gosto de ler”, prossegue na conversa.
Apesar dos tantos anos de experiência, João Câmara revela que escrever sempre será uma atividade difícil para ele. “Devo dizer que, não sendo um escritor profissional, acho tudo complicado. Os textos se urdem em forma de contos porque estão entre o que quero e o que posso, a escolha se dá neste espaço exíguo”, ressalta. “No momento, estou escrevendo um texto que não sei bem o que é e já vai em 500 páginas, mas ainda não se determinou como contos, novela, rapsódia. Já há mais personagens que o espaço da cidade em que moram”.
A busca por inspiração pode vir de vários lugares e Câmara define o audiovisual em suas diferentes fontes como essenciais para sua construção ficcional, em particular nesse novo projeto. “Vejo cinema, muito. Mesmo quando o filme é ruim, de diálogos pobres, de enredo banal, de música idiota, ainda haverá a fotografia de uma paisagem, uma cidade remanescente, reminiscente também. O diretor não viu isso, o produtor não cortou, o filme dá esse regalo a quem não o abandona. Sempre é surpreendente, isso melhora até a canastrice dos atores, aproxima-os do perdão humanitário”, afirma o autor.
No fim da entrevista, o escritor reafirmou que está sempre aprendendo, mas não passou sem deixar uma contribuição para quem pretende seguir os rumos da escrita. "Sou um escritor idoso principiante, não sei se estou posição de dar conselhos a jovens com projetos de maturidade, mas digo de forma inegociável que escrevam para si mesmos. Não escrevam para o público leitor ou para o editor. Escritos dessa ordem são tornados reais apenas por profissionais de gênio, altamente capacitados", pontua o artista.

