Justiça condena estado a pagar indenização a paciente que teve cirurgia suspensa na Covid-19
A decisão é a Terceira Câmara de Direito Público, que manteve a condenação determinada pelo primeiro grau. Segundo TJPE, paciente receberá R$ 10mil por danos morais
Publicado: 23/09/2025 às 14:07

TJPE lançará ferramenta na próxima segunda-feira (21) (DIVULGAÇÃO/TJPE)
O Tribunal de Justiça de Pernambuco condenou o estado de Pernambuco a pagar uma indenização de R$ 10 mil a um paciente que teve uma cirurgia oncológica eletiva adiada por causa da suspensão de procedimentos durante a pandemia de Covid-19.
A decisão é a Terceira Câmara de Direito Público, que manteve a condenação determinada pelo primeiro grau.
Segundo a decisão da Terceira Câmara de Direito Público, o paciente receberá indenização por danos morais.
Segundo o tribunal, o órgão colegiado negou, de forma unânime, provimento ao agravo interno em reexame necessário e apelação cível da Procuradoria Geral do Estado (PGE/PE).
O relator do recurso é o desembargador Luiz Carlos de Barros Figueiredo.
O julgamento do recurso ocorreu no dia 16 de setembro. Também participaram da sessão da Terceira Câmara de Direito Público os desembargadores Itamar Pereira da Silva Junior e Waldemir Tavares de Albuquerque Filho.
O que aconteceu
Segundo o TJPE, “amparado no Decreto Estadual nº 48.809/2020 e na Portaria Conjunta 107/2020, o Estado de Pernambuco adiou a realização de procedimentos eletivos devido à situação de calamidade pública de repercussão internacional no período da pandemia do Covid-19”.
Por isso, houve o adiamento da cirurgia oncológica de paciente idoso diagnosticado com neoplasia maligna da pele do couro cabeludo e expressa indicação médica para ressecção cirúrgica.
No primeiro grau do TJPE, a sentença da 1ª Vara da Fazenda Pública de Jaboatão dos Guararapes determinou, no dia 27 de janeiro de 2023, a condenação do Estado para promover o agendamento de cirurgia para ressecção de tumor no couro cabeludo do autor, bem como o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil.
Nos recursos interpostos no segundo Grau do Tribunal, a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) alegou que a “ação estatal não configurava omissão ilícita, mas sim a representação do exercício regular de direito, indispensável à gestão dos recursos de saúde para o enfrentamento da crise sanitária provocada pela pandemia”.
No primeiro grau, o paciente alegou ser portador de carcinoma basolcelular precisando realizar cirurgia para a sua retirada e para fazer um estudo citológico.
O procedimento foi solicitado à Policlínica Carneiro Lins, em Jaboatão. Na época, ele foi informado da “impossibilidade de agendamento em razão de se tratar de cirurgia eletiva a qual estava suspensa no Estado de Pernambuco, em decorrência da pandemia causada pelo Covid19’.
Na alegação inicial, o paciente afirmou que a negativa da cirurgia “tem causado abalo emocional ao autor que deve ter seu dano moral ressarcido. Pretende, inclusive em tutela de urgência, compelir o réu ao custeio do procedimento”.
Decisão
De acordo com o desembargador Luiz Carlos de Barros Figueiredo, a alegação estatal não encontra fundamento legal no próprio ato normativo em que se baseou a suspensão da cirurgia.
“A Portaria Conjunta SES/SPS nº 107/2020, ao mesmo tempo em que suspendia os procedimentos eletivos em geral, estabelecia exceções claras e inequívocas. Em seu artigo 3º, inciso IV, a referida portaria ressalvava expressamente a manutenção das ‘cirurgias eletivas inadiáveis como cirurgias oncológicas’. Ora, a condição do Agravado amolda-se, com perfeição solar, à exceção normativa. A cirurgia para ressecção de um carcinoma não é uma cirurgia eletiva comum; é uma cirurgia oncológica e, como tal, inadiável”, descreveu no voto.
O relator esclareceu na decisão que a pandemia da Covid não deu salvo-conduto para que o Estado deixasse de prestar atendimento a outros pacientes com doenças graves.
“A pandemia de Covid-19, por mais grave e disruptiva que tenha sido, não conferiu ao Poder Público um salvo-conduto para descurar de outras enfermidades graves que continuaram a afligir a população. A gestão da crise exigia, sem dúvida, a reorganização de prioridades, mas não o abandono de pacientes com doenças de gravidade manifesta, como o câncer”, afirmou.
O magistrado entendeu que a demora excessiva e injustificada na prestação de tratamento de saúde essencial configurou a omissão culposa do ente público. “Configurada, pois, a omissão culposa do Estado e o nexo de causalidade com o sofrimento imposto ao agravado, exsurge o dever de indenizar o dano moral. A angústia, a aflição e o temor vivenciados por um paciente idoso, portador de neoplasia maligna, que se vê desamparado pelo sistema público de saúde, aguardando por um procedimento cirúrgico por tempo irrazoável, são sentimentos que transcendem, em muito, o mero dissabor cotidiano, atingindo a própria esfera da dignidade humana”, concluiu Figueiredo.

