"Cruzamento de informações e provas documentais geram chance maior de condenação de Bolsonaro", avalia professor
Ex-presidente Jair Bolsonaro e outros sete réus no processo da trama golpista serão julgados pela primeira turma do STF a partir do dia 2 de setembro
Publicado: 18/08/2025 às 01:00

Ex-presidente Jair Bolsonaro (Foto: KEBEC NOGUEIRA/METRÓPOLES @kebecfotografo)
Próximos passos no Supremo Tribunal Federal (STF) após os réus do Núcleo 1 da ação que investiga a tentativa de golpe de Estado apresentarem as alegações finais serão definidos a partir de 2 de setembro, quando o STF inicia o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete acusados.
Eles respondem por crimes como organização criminosa armada, golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O caso será analisado pela Primeira Turma, presidida pelo ministro Cristiano Zanin, que marcou cinco sessões extraordinárias até 12 de setembro para ouvir a acusação, as defesas e os votos dos ministros.
O Diario de Pernambuco conversou com o advogado e professor de direito constitucional e eleitoral Felipe Ferreira Lima, que analisa a possibilidade de Bolsonaro ser preso. “O cruzamento entre os depoimentos, as delações - sobretudo a de Mauro Cid - e as provas documentais geram uma chance maior de que o ex-presidente seja condenado”, avalia.
Ele acrescenta que o histórico processual também pesa: "A robustez do material colhido, somada a episódios como o descumprimento de medidas cautelares durante a investigação, aumenta o risco de condenação”. O professor ainda acrescenta que caso Bolsonaro seja condenado, “o cumprimento da pena não será imediato: o ex-presidente poderá recorrer até o trânsito em julgado".
Em contrapartida, segundo Lima, “o núcleo bolsonarista já se movimenta como se a condenação fosse certa, articulando até internacionalmente e pensando na estratégia política para 2026”.
Em cenário de prisão, por se tratar de ex-chefe de Estado, Bolsonaro não deve ser encaminhado a um presídio comum. "A tendência, seguindo precedentes como os de Luiz Inácio Lula da Silva e Michel Temer, é a custódia em dependências especiais de órgãos policiais ou em regime domiciliar, conforme decisão da Corte", explica o professor de direito constitucional.
Trama central
A denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) sustenta que Bolsonaro liderou uma articulação para se manter no poder após a derrota nas eleições de 2022.
De acordo com a acusação, o plano começou ainda em 2021, com ataques ao sistema eletrônico de votação e à integridade do processo eleitoral, e ganhou força com a mobilização de apoiadores em atos antidemocráticos.
A tentativa de ruptura culminou no dia 8 de janeiro de 2023, com a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes, em Brasília.
Os demais réus do núcleo 1 são ex-ministros e assessores próximos, como Anderson Torres (Justiça), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Walter Braga Netto (Casa Civil) e Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), além de Almir Garnier (Marinha), Alexandre Ramagem (ex-Abin e atual deputado federal) e Mauro Cid (ex-ajudante de ordens e delator).
Rito no Supremo
No julgamento, segundo o regimento do STF, após a leitura do relatório pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, terá até uma hora para sustentar a acusação. Em seguida, cada defesa apresentará seus argumentos, também por até uma hora.
O julgamento se dá por maioria simples: três votos entre os cinco ministros da Primeira Turma definem a condenação ou absolvição.
Segundo o professor, o voto do relator inaugura a fase de deliberação. "O primeiro voto é sempre do relator, que apresenta o histórico da instrução processual e dá o voto principal. Depois, seguem os outros ministros, que podem acompanhar ou divergir”.
Os ministros se manifestam seguindo a ordem: Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e, por último, Cristiano Zanin.
Existe a possibilidade de pedido de vista - prazo de até 90 dias para reanálise do processo - o que pode adiar a conclusão. Felipe Ferreira Lima destaca que, apesar dessa prerrogativa, a relevância nacional do caso tende a priorizar seu desfecho.
Precedentes e impactos
A eventual condenação colocaria Bolsonaro entre os ex-presidentes que já tiveram passagens pelo sistema prisional desde a redemocratização, como Fernando Collor de Mello, Michel Temer e Luiz Inácio Lula da Silva.
Para Lima, o histórico mostra que a prisão de ex-chefes de Estado, embora rara em outras épocas, tornou-se uma realidade republicana no Brasil, ainda que envolta em disputas narrativas e implicações políticas.
“A história mostra que quatro ex-presidentes já sofreram prisão. Isso pode ser visto como prova de que a lei vale para todos, mas também pode ser usado politicamente para construir narrativas de vitimização ou heroísmo”, diz ele.
Desde a redemocratização, quatro ex-presidentes foram presos: Luiz Inácio Lula da Silva (2018-2019), Michel Temer (2019), Fernando Collor de Mello (2025) e Jair Bolsonaro (2025), atualmente em regime domiciliar.
Perspectivas
Com as alegações finais entregues na última quarta-feira (13), a fase de instrução processual foi encerrada, tornando o processo concluso para julgamento. A partir de agora, o caso depende apenas da apreciação dos ministros.
Somadas, as penas máximas pelos crimes dos quais o ex-presidente Jair Bolsonaro é acusado somam 46 anos de prisão. Se confirmada, a condenação, além de eventual pena privativa de liberdade, deve influenciar estratégias de aliados, incluindo movimentos no Congresso e articulações internacionais, projetando cenários para as eleições de 2026.

