Ida do Brasil à OMC faz parte da estratégia do diálogo, dizem especialistas
Para a cientista política Priscila Lapa, o governo brasileiro não está disposto a levar as coisas para o confronto em um primeiro momento
Publicado: 24/07/2025 às 22:06

Secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Itamaraty, Philip Fox-Drummond Gough, (Foto: Fernando Frazão – Agência Brasil)
Acompanhado de aproximadamente de 40 países e blocos econômicos, incluindo as nações do Brics, a delegação brasileira se posicionou diplomaticamente, na última quarta-feira (23), durante a reunião do Conselho Geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra, na Suíça, contra a taxa de 50% imposta ao Brasil pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Segundo especialistas, recorrer ao órgão internacional é parte da estratégia de diálogo com os norte-americanos.
“Desde o início, o governo brasileiro procurou mostrar que não era uma decisão unilateral. Quando recorre à OMC, é numa tentativa de não tratar de uma forma isolada, que pareça que é uma questão do Brasil. Eles expõem a questão brasileira dentro de um contexto que é mundial e que tem afetado a relação dos Estados Unidos com o restante do mundo também”, explica a cientista política, Priscila Lapa.
De acordo com o professor de economia e finanças da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Luiz Maia, a partir do momento que o Brasil entrar formalmente com uma ação junto à OMC contra as medidas impostas, o órgão poderá “condenar o país norte-americano” e “autorizar o Brasil a retaliar, com alguma outra medida que vá contra os interesses dos Estados Unidos”.
“No passado, quando os Estados Unidos tiveram práticas protecionistas contra produtos brasileiros, o Brasil também chegou a acionar os mecanismos de proteção e defesa da concorrência da OMC, venceu e ganhou o direito de retaliar os Estados Unidos”.
No entanto, na prática, o Brasil não tem o histórico de aplicar a retaliação permitida pela OMC, mas sim, usa como “estratégia de negociação”, segundo o especialista.
“O Brasil pode trazer para a mesa de negociação o fato: ‘Existe um consenso internacional. Posso divulgar para o mundo que os Estados Unidos está praticando concorrência de forma desleal, fazendo protecionismo’. Isso prejudicaria a reputação dos Estados Unidos e afastaria quem quisesse fazer acordos, porque o país vai se tornando um país com reputação pior, como um parceiro que não é confiável para se fazer acordo”, detalhou o professor.
Ainda segundo Maia, a imagem do país norte-americano sairia prejudicada com a repercussão da ação do Brasil, que, em contrapartida, não teria benefícios expressivos com um resultado positivo na OMC. O estudioso também ressalta que o governo brasileiro deverá “pensar duas vezes” se receber o direito de retaliar.
Para o professor, “os Estados Unidos terão a perda de reputação de maneira geral, um impacto na opinião pública global, nas análises, nas avaliações que se faz no mundo afora, e o Brasil, pode ficar um pouco mais bem visto, como sendo alguém que defende seus interesses, que procura manter as regras do jogo”.
“Do ponto de vista dos seus interesses comerciais, o Brasil não ganha muito. Mesmo recebendo um direito autorizado de retaliar, deve pensar duas vezes se vai fazê-lo. Os Estados Unidos têm um poder muito maior e se o Brasil retaliar, mesmo com a proteção da OMC, nada impede os Estados Unidos de dobrar o volume de sanções e prejudicar ainda mais o Brasil, porque o poder que eles detêm é desproporcional em relação ao nosso”, complementou.
Para Lapa, o caminho do diálogo é a atitude mais assertiva a continuar sendo estabelecida pelo governo Lula. Não apenas pela via do governo, mas também com o setor produtivo.
“O governo brasileiro está estabelecendo diálogos. Vai manter isso, não apenas tratando essa questão via governo, mas também dos interesses dos importadores, dos produtores norte-americanos. O governo vai procurar buscar uma camada de fortalecimento dessa relação, e vai ainda tentar esgotar de todas as formas possíveis essa via do diálogo”, concluiu.

