MPT processa Hytalo Santos e marido por trabalho análogo à escravidão
Ação civil alega que os dois aliciaram jovens por meio de promessas de fama e privaram a liberdade dos adolescentes confinados
Gabriella Braz - Correio Braziliense
Publicado: 12/12/2025 às 22:42
Hytalo Santos e Israel Nata Vicente no momento em que foram presos (REPRODUÇÃO DE VÍDEO)
O Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou ação contra o influenciador Hytalo Santos e o marido, Israel Nata Vicente, conhecido como Euro, por tráfico de pessoas e trabalho análogo à escravidão. O processo, que corre em sigilo de justiça desde setembro, foi divulgado em nota pelo órgão nesta sexta-feira (12/12).
Hytalo e Euro estão presos desde agosto, acusados de exploração sexual infantil devido a conteúdo produzido usando a imagem de crianças e adolescentes, que viviam com o casal. Na nova ação, o MPT se refere exclusivamente às acusações no âmbito trabalhista. No texto, o Ministério ressaltou decretos que apontam exploração sexual e trabalho em condições análogas à de escravo como “duas das piores formas de trabalho infantil”.
Segundo a nota, o casal liderou, durante anos, um “lucrativo esquema de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual e de submissão a trabalho em condições análogas à de escravo, com dezenas de vítimas, incluindo crianças e adolescentes”. A denúncia aponta que os dois “compraram” os menores por meio de promessas de fama, custeio de despesas, ajuda financeira mensal e eventual doação de presentes. O texto caracteriza os pais das vítimas como “pessoas de baixa instrução” que foram “ludibriadas pela perspectiva ilusória de que seus filhos desfrutariam de segurança financeira e um padrão de vida mais confortável ao lado dos réus”.
“Como é público e notório, 'Hytalo Santos' e 'Euro' obtinham diversas formas de monetização por meio da exploração da imagem e o corpo das crianças e adolescentes por eles aliciados”, diz a denúncia. “Diariamente, as 'crias' eram exibidas, em fotos e vídeos postados nas redes sociais, seminuas, com trajes sumários e provocativos, protagonizando danças sensualizantes e vexatórias, ao som de letras com alusão explícita a práticas sexuais e depreciativas à figura da mulher”.
Além dos conteúdos, o MPT cita os procedimentos estéticos feitos pelos menores, com o intuito de “potencialização de seu apelo sexual” e os eventos para qual os jovens eram levados. De acordo com a denúncia, as vítimas eram levados a ambientes "moralmente tóxicos", muitos deles relacionados ao crime organizado, onde eram apresentados como "troféus" e "oferecidas como prêmio em contextos de tráfico de influência, troca de favores, parcerias comerciais e relações de compadrio".
A denúncia lista ainda características que evidenciam o crime de trabalho escravo, conhecidas após oitivas com testemunhas do caso. São elas:
-Isolamento do convívio familiar;
-Confisco de meios de comunicação com o mundo externo;
-Ausência de convívio social mais amplo;
-Cerceamento da liberdade de ir e vir;
-Rígido controle sobre sua rotina;
-Agenda exaustiva de gravações, inclusive com privação de sono;
-Ausência de remuneração;
-Supressão da autonomia individual;
-Ausência de autonomia financeira;
-Coação psicológica (ameaça permanente de descarte);
-Ingerências sobre a definição de sua identidade de gênero e sua orientação sexual.
-O processo agora segue na fase de apresentação da defesa dos réus.
As vítimas
Mesmo após a prisão dos réus, o MPT destacou que alguns dos jovens não reconheceram a gravidade dos casos e defenderam Hytalo e Euro, o que, segundo a denúncia, é comum entre vítimas desses crimes. “O longo tempo de convivência entre as partes, a presumível influência dos réus na fase inicial do processo de construção da personalidade dos adolescentes, quando eram ainda mais suscetíveis a discursos de alienação e práticas de lavagem cerebral, a natural dívida de gratidão resultante das benesses materiais oferecidas na ilícita tentativa de “compra” do consentimento dos pais, a inversão de valores causada pela prolongada imersão no alienante mundo da internet, tudo concorre para que as vítimas não enxerguem o ímpeto exploratório e o caráter criminoso das ações”, argumenta.
Segundo o MPT, essa falta de reconhecimento do crime também pode estar relacionado a uma crença das vítimas de que o casal era a única alternativa para uma vida aparentemente glamorosa.
Além das vítimas, o texto aponta que os genitores não parecem compreender a gravidade das ações. Desse modo, o MPT impôs aos responsáveis as que não permitam que os filhos, mesmo os emancipados, participem de produção de conteúdo digital com conotação sexual ou sejam submetidos a exploração sexual e de trabalho infantil de qualquer natureza. O descumprimento das obrigações acarreta multa para os genitores.